Velho, velho, velho
[…]o inverno
Eugénio de Andrade
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Anabela Borges DR |
Este é o Inverno das nossas vidas.
Talvez que os dias nem sempre se esgotem no passar das horas, pois que os instantes que as preenchem pairam num vazio de incertezas como acontece no primeiro dia de Inverno. E o Inverno prolonga-se de forma incessante, e essa delonga dita o nosso amor e o nosso humor, o nosso aconchego e o nosso frio, o que nos preenche a ideia de espantos e desencantos sisudos, o nosso vazio.
O Inverno, para lá da vidraça, pode ser lindo, ter a sua graça: as folhas, que não se sentem observadas, rodopiam, levitam e balançam, numa estranha dança; a água, que é do tempo muito antiga, não se vendo controlada, salta, desce, encharca, respinga.
E o rio que corre, solitário, leva a fúria das nossa vidas, indiferente a tudo o que o cerca, indiferente ao frio do inverno dos nossos corações. Leva o infortúnio dos nossos dias, os medos secretos que queremos esconder, e o desejo incontido dos dias claros. O rio lava as almas dos bichos, arrasta restolhos de tudo… restolhos de nós.
O Inverno sobressalta-nos e encanta-nos, mas é de um encanto que não sabemos explicar, é o espanto de nos sabermos pequeninos, impotentes e enfermos perante o poder da Natureza, que detém as rédeas das nossas vidas como ninguém.
Vento, chuva, frio, neve… pois é um incómodo e deve ser um respeito, deve. Mas, para lá da vidraça, podem ter a sua graça. O inverno visto da janela pode ser uma cena bem apreciada, curiosa, bela.
Mas a Primavera, quem esconde o seu desejo mais profundo de ver as luz nos caminhos, nos dias de primavera? A primavera da vida e a Primavera do sol, pássaros a largar beirais e flores a romper perfumes e cores, onde apenas reinavam lamaçais.
Está visto. Estou melancólica por causa do longo inverno das nossas vidas.
E viva o Dia de São Valentim também.