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OS HOMENS TAMBÉM SOFREM

Nesta minha primeira crónica gostaria de partilhar algumas ideias e reflexões sobre um tema que é muito próximo, como ser humano que vive com uma doença crónica e com dor crónica, que é o sofrimento que muitos homens vivem em silencia, seja ele motivado por questões físicas, emocionais, espirituais, entre outras.

Vivemos numa sociedade com grandes avanços nas questões emocionais, na gestão e expressão de emoções, onde o acompanhamento psicológico, psiquiátrico e psicoterapêutico já não visto como sendo algo apenas necessário para “malucos”, “doidos”, para quem não tem mais nada que fazer na vida a não ser andar triste, revoltado, frustrado.

No entanto, ainda vivemos numa sociedade “machista” onde o Homem é visto, inúmeras vezes, como o pilar da sociedade, família, sendo incutido desde sempre o cargo de responsável, de protetor, de organizador, onde é exigida grande racionalidade e onde as emoções são empurradas para segundo plano, pois apenas interferem na tomada de decisões. O Homem não se pode queixar, pois isso é coisa de mulheres, o Homem não pode expressar sentimentos em demasia, pois ou é considerado de afeminado, de homossexual, sendo que com um Homem as conversas devem ser sempre sobre motivos e assuntos masculinos, nos quais as emoções não contam, muitas vezes, sendo que há sempre magníficas exceções.

O Homem que sofre, tantas e muitas vezes sofre sempre em silêncio, não partilhando inclusive com a sua família, a sua esposa ou companheiro, para não ser motivo de preocupação, não bastassem as vicissitudes da vida e os seus desafios. Guarda em si mesmo os seus dilemas, as suas preocupações e emoções, encerrando muitos dos assuntos emocionais no armário onde coleciona fantasmas de outros tempos, que não foram falados quer por não ter com quem falar quer por não querer enfrentar as suas emoções. Assim, o Homem vai sucumbindo lentamente às suas emoções, desenvolvendo, em muitos casos, doenças do foro psicológico e mental, derivada de uma enorme sobrecarga mental e emocional, que não foi cuidada a tempo, que não foi partilhada e conversada quer por vergonha quer por medo.

Há um enorme número de pessoas do sexo masculina a ser acompanhada em psicologia, psiquiatria e psicoterapia, sendo que muitas vezes também sem segredo, pois não querem ser gozados pelos seus pares, com quem vestem a sua armadura e o seu sorriso amarelo, afirmando que está tudo bem, dizendo as suas piadas, participando nas brincadeiras, quando a sua maior vontade é de gritar chorar e desaparecer. Com este comportamento vai arrastando os seus problemas, aumentando o seu sofrimento e impedindo o desenvolvimento saudável do seu processo terapêutico e de cura, onde tem que ser honesto com as suas emoções em todos os contextos.

Por estes motivos há uma percentagem de homens que cometem suicídio, em maior número do que as mulheres, deixando inúmeras questões para as pessoas que ficam para trás, sobre os comos, os porquês, pois as emoções não foram geridas, não foram partilhadas e há um total desconhecimento da própria família, amigos e colegas, do sofrimento atroz desses homens, que veem no suicídio a única solução para terminar o seu sofrimento, aquele que foi vivido em silêncio forçado, em segredo.

Qual são os motivos deste meu discurso e desta minha crónica, falando do sofrimento dos Homens, sem estar de todo a desvalorizar o sofrimento das mulheres? Os motivos desta minha crónica, da escolha desta temática têm como intento conduzir a uma reflexão de todos os leitores, para pararem um pouco e olharem atentamente para o seu amigo, companheiro, esposo, namorado, filho, colega, para observarem os seus comportamentos, os seus silêncios que muitas vezes podem ser simples chamadas de atenção que não damos conta por estarmos a viver a um ritmo tão acelerado, que nos impede, havendo sempre mea culpa, de escutar, de nos mostramos disponíveis para essa pessoa que precisa do nossos cuidado e não consegue pedir ajuda.

É algo tão simples como perguntar aos Homens que fazem parte do nosso ciclo mais íntimo, como estão, como se sentem, se querem partilhar algo connosco, perguntar sobre o seu dia, as suas relações e o seu trabalho, mostrando disponibilidade para os escutarem, mesmo que seja num silêncio acompanhado, onde tantas vezes são ditas mais palavras do que as que poderiam ser verbalizadas. Mostrar a nossa disponibilidade é uma forma de acompanhar, de mostrar que estamos presentes e queremos saber o que se passa, queremos ajudar, queremos acompanhar o processo, assumindo sempre que pedir ajuda não é sinal de fraqueza, mas sim a mais bela expressão da vulnerabilidade de todos nós.

Somos seres vulneráveis, mas teimamos em pensar que chorar, pedir ajuda, reconhecer erros e limitações são facetas de alguém fraco, quando a maior força do ser humano é a sua resiliência, a sua capacidade de superação e reconhecimento dos seus limites, assumindo que pode precisar de ajuda para lidar com as suas emoções, sem ter qualquer sentimento de culpa, de vergonha. Ser emotivo é de Homem, mostrando o que sente, o que pensa de forma consciente e sem se preocupar com o comentário, opinião e juízo alheio, por mais que o mesmo possa interferir um pouco com o nosso sentir e limitar a nossa expressividade, por não nos sentirmos aceites.

Os Homens também sofrem quer seja de dor física ou emocional e é comum, no que diz respeito à dor física, não se queixarem, escondendo e aguentando a sua dor em segredo, para não serem criticados e julgados, por um sintoma que não de todo sua culpa, que é algo que até pode ser muito importante para ser observado por quem de direito, para avaliar as causas. Os Homens vão aguentando a sua dor em silêncio estando a contribuir, tantas vezes, para maiores problemas de saúde, tendo vergonha de assumir perante o médico que sentem dores que não sabem explicar e o que se torna pior, quando são diagnosticadas doenças sem causa conhecida e pouco reconhecidas na sociedade.

Caro leitor, se sentes dor física procura aconselhamento, procura ajuda e investiga as suas causas, deixando de assumir a postura de forte “só para inglês ver”, pois é algo que te diz respeito, que pode originar novos problemas, que tem que ser estudado. Se sentes for emocional, psicológica, fala com um amigo, com alguém que confies e não guardes essa for para ti, pois a dor partilhada torna-se mais fraca, podendo ajudar-te a encontrar soluções, estratégias que te possam ajudar a viver com essa dor, da melhor forma possível, com qualidade de vida.

Os Homens também sofrem diariamente sem que ninguém dê conta, sem conseguirem expressar as suas emoções, a sua dor e sofrimento, o que se vai acumulando e interferindo com todas as áreas da sua vida, com as suas relações, tão-somente porque não há partilha, compreensão, aceitação e ajuda. Os Homens também sofrem pelos motivos mais simples, pelas relações, pelos filhos, pelo mundo e é com toda a dignidade e sem ferir a sua masculinidade que devem e podem expressar o seu sentir, sentindo-se bem consigo mesmos, sem recearem preconceitos e estereótipos sem sentido.

Os Homens sofrem, como qualquer ser humano e por isso, se conheces algum homem em sofrimento, ajuda-o a expressar o seu sentir a encontrar o seu caminho, pois todos sofremos por algo e a partilha desse sofrimento torna o caminho mais leve e fácil.

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