Escrever sobre as nossas emoções é, muitas vezes, um ato de grande coragem para todos aqueles que as ousam enfrentar, sejam elas mais ou menos positivas, com maior ou menor impacto no nosso bem-estar, que estejam quer à flor da pele quer escondidas durante muito tempo, numa espécie de recalcamento consciente, pelo medo de as encararmos.
Lidar com as nossas emoções nem sempre é um processo fácil, sendo que muitas pessoas fazem acompanhamento psicológico ou outros acompanhamentos terapêuticos, para conseguirem lidar com as suas emoções querendo, para isso, fazer essa viagem acompanhados, para que o Outro seja o reflexo do seu sentir, possa apoiar no encontro de soluções, de orientações. No entanto, existindo ainda o preconceito em relação ao acompanhamento terapêutico, há muitas pessoas que não conseguem encarar as suas emoções e sentimentos, guardando-as num local bem escondido, com a esperança de que não venham a ser encontradas.
É neste caminho terapêutico que a escrita poder ser uma grande aliada quer seja num percurso acompanhado ou solitário, pois ao colocar as nossas emoções por escrito estamos a atribuir-lhes um sentido mais real, comprovando a sua existência e a necessidade de serem enfrentadas com coragem e até com o medo em não saber o que fazer com tantas emoções. Para iniciar o processo de escrever, sobre as nossas emoções, tem de haver um compromisso connosco próprios para iniciar e continuar essa viagem, pois se a começamos e deixamos a meio, as emoções que estavam a ser trabalhadas ficam à deriva no nosso interior e a causar um grande transtorno emocional.
Escrever sobre as nossas emoções é um processo contínuo onde o objetivo não é somente escrever sobre o que nos provoca dor, tristeza, raiva, mágoa, frustração ou outras emoções menos positivas, havendo lugar para escrever sobre o que nos faz vibrar, sobre a felicidade, esperança, gratidão, amizade, amor e outras emoções positivas, de modo a criarmos um equilíbrio emocional que nos permita percorrer este caminho de gestão emocional de um modo mais seguro, consciente e tranquilo. Escrever é colocar no papel tudo o que sentimos, sem qualquer juízo de valor, sem criticar o nosso sentir, pois todas as nossas emoções são genuínas, todo o nosso sentir é único e verdadeiro, precisando ser aceite como tal.
Para quê escrever sobre o que dói? Não vai criar mais dor e mais angústia? Estas são duas perguntas chave que me têm feito nos workshops de escrita terapêutica (a terapia que dinamizo), associadas ao receio de lidar com essa dor, com essas emoções e situações menos positivas. De fato, escrever sobre a nossa dor inicialmente irá causar algum desconforto, poderá aumentar a dor que sentimos, porém é maior a dor de manter algo que nos magoa diariamente e durante toda a nossa vida, do que lidar de uma vez só com aquilo que nos está a fazer sofrer. Por isso, escrever sobre o que nos magoa, sobre as nossas “pedras no sapato”, sobre tudo aquilo que nos retrai e bloqueia, vai permitir encarar o dilema de frente, restruturando a forma como nos situamos no problema, ajudando a encontrar estratégias e soluções, ajudando a diminuir a dor, serenamente, ao aceitarmos esse nosso sentir como parte de nós, como uma aprendizagem para a nossa Vida.
Para quê escrever sobre felicidade e o amor, se não consigo sentir essas emoções, estando a enfrentar tantos dilemas? Para que escrever sobre algo que parece ser positivo, mas que na minha vida é algo menos positivo e causa dor? Estas são outras duas perguntas chave que me têm colocado quando incentivo a escrever sobre o amor, gratidão e esperança, consciente de que há inúmeros desafios na vida dessas pessoas e que não conseguem ver o outro prisma da Vida. Esse é o grande propósito de incentivar a escrever sobre emoções positivas, mesmo apesar das vicissitudes menos boas da Vida, para que possam compreender e reconhecer que também vivem momentos de felicidade, que os desafios não deixam de existir, mas que depois de escreverem sobre algo positivo, certamente terão outra energia para lidar com esses problemas.
A esta altura muitos leitores poderão estar a perguntar-se do porquê desta crónica que fala unicamente sobre a escrita, podendo eu responder que esta crónica tem como objetivo convidar a uma reflexão sobre as emoções de cada leitor, o modo com as tem gerido, que ferramentas tem utilizado, ao mesmo tempo esta crónica quer oferecer uma nova ferramenta para quem fizer sentido em iniciar um processo de gestão emocional através da escrita. Ao mesmo tempo, sendo eu escritor e formador na área da escrita terapêutica que é uma terapia que utiliza a escrita como ferramenta de um percurso terapêutico de gestão de emoções, é meu objetivo que cada texto que escrevo, conduzir a um percurso de compreensão e aceitação das emoções de quem me lê.
Tornando esta crónica um pouco mais prática, gostaria de lançar um desafio a cada leitor, para que escreva sobre o que lhe apetecer, onde deve identificar as emoções associadas a determinada situação, como se sente em relação a essa situação, qual o caminho que quer seguir ou o que o leva a não conseguir iniciar esse mesmo percurso.
Para ser mais fácil, poderão construir um texto (não se trata de avaliar se escreve bem ou mal, pois quando se trata de escrever sobre as nossas emoções não interessa as regras de escrita, mas sim deixar fluir a voz do coração), no qual respondam a esta simples questão “O que eu quero e tenho para dizer a mim mesmo?”. Certamente esta questão irá originar uma demanda pelo mundo dos pensamentos, das emoções, dos sentimentos e será o mote para o começo de um percurso de gestão de emoções.
Ao mesmo tempo poderei aconselhar um simples e prático exercício de escrita terapêutica, relacionado com a gratidão, que consiste na elaboração de uma simples mensagem, carta ou correio electrónico dirigido a um amigo ao qual querem reconhecer a vossa gratidão pela sua amizade, pelas aprendizagens, de modo a nutrir a vossa relação. Certamente não devem ter muita dificuldade em identificar esse amigo a quem podem escrever e assim, poderão usar este mesmo exercício para tantas outras pessoas e estarão a gerir emoções positivas, a criar emoções em quem vos irá ler.
Escrever sobre as nossas emoções não tem que ser um processo muito complexo, desde que tenhamos a coragem de arriscar iniciar esse mesmo processo, conscientes de que será vital para a nossa saúde emocional e mental, que irá ajudar a reestruturar as nossas relações, que serão nutridas com mensagens de amizade, amor e gratidão. Ao mesmo tempo também poderemos tocar nas feridas que julgávamos cicatrizadas, sentir alguma dor, mas certamente ao lidar com essas feridas, estaremos a preparar para realizar a sua cura, para que não fique qualquer sequela na nossa Vida e para que possamos viver e apreciar o tanto que há de bom no nosso Viver.
Aceitam os desafios que vos coloquei? Vamos então escrever sobre as nossas emoções, vamos dar vida o que sentimos, para que nos transformemos, para que nos libertemos de algumas amarras do passado, para que possamos apreciar cada instante da nossa Vida com mais amor por nós e pelo Outro, com mais Vida em nós.