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Cidadania e Sociedade

JUSTIÇA TERAPÊUTICA

A Justiça Terapêutica, não é algo recente, surgiu pela primeira vez nos anos 90, é destinada a pessoas com doenças mentais e/ou dependências, implicadas em processos jurídicos que resultam de atos provenientes das respetivas patologias, e conjuga a execução da lei com a prestação de cuidados de saúde e sociais.

Embora a sociedade, normalmente, clame por penas duras, vingativas, que retirem a pessoa da comunidade, isto é uma finalidade ilusória, pois um dia a pessoa vai ser libertada, e a decisão que deve ter tida em conta é se pretendemos ter uma pessoa tratada e ressocializada ou uma pessoa doente, igual ou pior do que quando foi retirada da sociedade?

Entende-se que quando alguém comete um crime considerado mais censurável, os valores da sociedade são abalados e se o Estado não reage e pune, do ponto de vista psicológico o valor em causa tende a perder importância. O Estado e o direito têm de reagir sob pena de esses valores se banalizarem. Aqui a função da pena é de reafirmar o valor, e a sua dignidade, bem como de pacificação social. O estado deve aplicar uma pena coativa com vista a salvaguardar essa dignidade do valor. Pune-se para que não se volte a praticar. Pretende-se passar uma mensagem dissuasora da pena.

Pois bem, mas para que esta pena tenha alguma utilidade é preciso ter em atenção a ideia de socialização na função da pena, sendo o Estado que deve proporcionar a ressocialização do indivíduo, e não o seu abandono, e para que tal aconteça, o criminoso tem de passar a ser alguém que respeita os valores penais, que durante a prisão aprenda a respeitar os direitos fundamentais.

No entanto, como supra- referido, há indivíduos que são portadores de doenças mentais e/ou de dependência de substâncias, ora estes indivíduos são imunes à pena, ou seja, a pena não surte o efeito pretendido, o agente não consegue ter consciência que violou um bem jurídico. Aqui pretende-se a correção da tendência criminosa, e a função secundária é de prevenção geral, quer no sentido da pacificação social, quer no sentido do revigoramento da confiança jurídica da comunidade na eficácia da tutela estatal dos bens jurídicos. O sistema penal devia atuar de forma a tratar a pessoa, equiparando o tratamento do individuo, seja do vício, seja da personalidade, à pena de privação da liberdade. Valor máximo da dignidade humana equiparado ao valor vida.

Nestes casos, medida eficaz não é sinónimo de medida austera. Não é o encarceramento que vai recuperar, que faz tratamento nem reinserção social, antes pelo contrário, pode promover a dessocialização destes indivíduos.

Eficaz é a medida que, além de servir de exemplo e de ressarcir a vítima, concebendo o sentimento de justiça, reeduca e reintegra o criminoso, que permita a reinserção social após a prática do crime e, consequentemente, garantam a manutenção da ordem pública e da paz social, amenizando assim o problema social com medidas eficazes, até porque o crime é uma desordem nas relações entre pessoas que vivem em comunidade, ou nas relações entre o criminoso e a comunidade onde se insere.

A Justiça Terapêutica visa uma maior humanização das normas jurídicas, do processo e do seu desenvolvimento, com o intuito que a lei e sua aplicação produzam efeitos terapêuticos e proporcionem o bem-estar biopsicossocial das pessoas, ao longo do processo, concebendo uma lei que fomente um impacto positivo nos sujeitos e proporcione consequências mais eficientes e eficazes, tal como conceder uma oportunidade para melhorar o indivíduo.

O nosso sistema jurídico prevê no seu Código Penal, nos artigos 83º a 90º, a Pena Relativamente Indeterminada, que são penas que se aplicam a reincidentes, aos quais se chama delinquentes por tendência, ou seja, estes indivíduos têm tendência para o crime, congénitas ou adquiridas, que lhes diminuem a liberdade de decisão e, consequentemente, a culpa; mas a defesa da sociedade e dos bens jurídicos não fica posta em causa, pois o tribunal de execução de penas é que avalia quando aquela tendência estiver ultrapassada.

Ora se podemos aplicar esta medida, porquê aplicar só depois da pessoa reincidir, visto que já são doentes e não lhe dar a oportunidade de tratamento logo na primeira condenação? Pois necessitam de tratamento desde antes do primeiro ato ilícito. Em Portugal, a aplicação das penas não faz esta diferença, punindo-se por castigo e não com a finalidade de tratar.

Devemos querer uma Justiça Terapêutica, que representa o trabalho multidisciplinar dos profissionais do Direito e dos profissionais de saúde que, de forma integrada, trabalham para oferecer uma perspetiva de vida e de cidadania aos criminosos e, por sua vez uma sociedade mais segura e justa, tratando por igual o que é igual, e diferente o que é diferente.

A saúde deve prevalecer sobre a lei e sobretudo sobre a vingança, pois só assim teremos realmente … Justiça.

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