A propósito da Lei n.º 31/2018. Publicada no Diário da República sob o n.º 137/2018, Série I de 2018-07-18, não posso deixar de fazer uma reflexão sobre o objectivo final desta lei em que logo no Artigo 1.º e 2.º diz o seguinte:”1-A presente lei estabelece um conjunto de direitos das pessoas em contexto de doença avançada e em fim de vida, consagrando o direito a não sofrerem de forma mantida, disruptiva e desproporcionada, e prevendo medidas para a realização desses direitos.
2-A presente lei prevê ainda um conjunto de direitos dos familiares das pessoas doentes previstas no número anterior.”
Como profissional da saúde tenho dificuldade em entender o interesse desta Lei uma vez que na minha opinião não tem aplicabilidade no contexto da clínica que se pratica actualmente, tendo em conta a abordagem que é feita e os procedimentos que são adoptados no tratamento dos pacientes.
Esta prática sempre existiu obedecendo os critérios e as decisões ao compromisso de serem partilhadas entre os doentes e/ ou familiares, dependendo a sua implementação ou não da aceitação do doente das propostas de tratamento programadas.
Nenhum profissional responsável aplica medidas inúteis muito menos desproporcionadas ou de
obstinação terapêutica e diagnóstica.
Os pacientes dão prestam livremente o seu consentimento escrito não só nas situações invasivas ou de risco como nas outras situações, sendo obviamente previamente esclarecidos sobre os planos terapêuticos preconizados de acordo com o diagnóstico cabendo ao doente aceitar ou recusar os tratamentos.
A decisão clínica sobre o plano terapêutico a estabelecer para cada doente é feita de acordo com a patologia do doente e sustentada na evidência cientifica.
O doente depois de devidamente esclarecido sobre a sua doença e dos planos terapêuticos mais adequados para o seu tratamento tem sempre liberdade de opção e de participação nas decisões clínicas quer seja no contexto de doença avançada e em fim de vida ou não, o que leva a concluir que os profissionais de saúde só poderão intervir, desde que o paciente manifeste vontade de se tratar.
A intervenção dos familiares terá lugar apenas e só se o paciente não conseguir manifestar de forma clara e objectiva a sua concordância ou recusa da intervenção terapêutica estabelecida que é sempre determinada baseada no rigor e na ciência.
Os procedimentos médicos terão de ser sempre orientados no sentido de tratar eficazmente e direcionados para cuidar adequadamente, aliviar e minimizar o sofrimento vivenciado pelo paciente.
O Consentimento informado é prestado de forma clara e objectiva e só depois de o doente ser
devidamente esclarecido e consiga demonstrar a clara compreensão sobre as informações que lhe
foram fornecidas é que estará em condições de assinar o documento que comprova a sua aceitação e que
permite e legaliza a intervenção do medico.
No ponto 4.º da artigo 3.º
É claro que a “contenção fÍsica com recurso a imobilização é sempre de carácter excepcional e funciona apenas quando não é possível resolver por outra via, sendo utilizada exclusivamente durante o tempo necessário para a resolução o problema.
Quanto ao artigo 5.º sobre o consentimento informado em primeiro lugar deixo aqui bem claro que não faz parte dos procedimentos médicos fazer “tratamentos não proporcionais, nem adequados ao estado clínico e tratamentos, de qualquer natureza, que não visem exclusivamente a diminuição do sofrimento e a manutenção do conforto do doente, ou que prolonguem ou agravem esses sofrimento”. Ao admitir esta possibilidade na Lei, o legislador desconhece certamente as competências profissionais dos médicos.
Quanto ao Artigo 6.º, todos sabemos que os cuidados paliativos já estão criados e a funcionar desde longa data, todavia o número de vagas disponíveis fica muito aquém das necessidades dos doentes, não tendo por isso resposta atempada para as solicitações emergentes o que é deveras constrangedor.
O doente tem de fato direito aos cuidados paliativos mas nem sempre tem vagas, sendo a percentagem de carência muito elevada
O Estado não tem investido, muito menos adaptado e alargado o numero de vagas para as realidades existentes.
Com base na precaridade das vagas disponíveis o apelo que proponho é que seja investido mais e que o número destinado à oferta seja alargada o mais urgentemente pois não esta de acordo com a realidade existente
No artigo 7.º da Lei onde fala sobre os cuidados domiciliarios prestados pelos cuidadores informais, para além de lhes ser fornecida formação especifica é necessário fiscalizar se de fato estão aptos ou não e se cumprem com rigor o que está preconizado. Essa responsabilidade deve ser da equipa domiciliaria que supervisiona estes serviços.
Artigo 8.º sobre o prognóstico vital breve” o que esta descrito no número 1 do artigo 8.º onde consta que as pessoas têm direito a receber sedação paliativa com fármacos sedativos devidamente titulados e ajustados exclusivamente ao propósito do tratamento do sofrimento, de acordo com os princípios da boa prática clínica e da leges artis, os quais já fazem parte dos procedimentos médicos normais.
O que tem de ser salvaguardado é que este ponto da Lei não seja interpretado para praticar medidas de eutanásia. Aqui sim é que é preciso ter cautela para não desvituar o propósito da questão.
Artigo 11.º Discrepâncias de vontades ou decisões, no ponto 1 “Em caso de discordância insanável entre os doentes ou seus representantes legais e os profissionais de saúde quanto às medidas a aplicar, ou entre aqueles e as entidades prestadoras quanto aos cuidados de saúde prestados”na minha opinião devem ser sempre respeitados os direitos dos doentes respeitando os conselhos éticos do Código de Ética Médica.
Em suma, com base no respeito pela liberdade e defesa da vida cabe ao doente e aos profissionais de saúde encontrar a solução certa de acordo com a responsabilidade individual de cada sem prejuizo da preservação do tempo de vida e do seu ciclo e evolução normal.