Desde 2017 até Junho de 2018, morreram 36 mulheres, vítimas de violência doméstica. É um número chocante e assustador. A mulher continua a ser uma vítima do silêncio, uma companheira das omissões de cônjuges e filhos, um repositório das frustrações e vícios e uma incansável transportadora de uma esperança doentia que muitas vezes termina com a sua morte.
As formas são inúmeras e até nas formas observamos o quão funesta pode ser a humanidade, o quão perverso pode ser o sentimento, o quão vil pode ser o ensejo.
Facas, estrangulamentos, armas de fogo, tudo serve de ferramenta para colocar cobro à vida, às mãos do amor. O amor não é violência, e a paixão não pode conceber a agressão, mas a verdade é que na maior parte destes casos, são maridos, companheiros e filhos que vestem o fato do homicida.
Triste realidade, realidade que mostra que não estamos a evoluir como sociedade, que resistimos a reconhecer a diferença, que somos inflexíveis perante outras conceções de realidade que não as nossas e que não aceitamos que outras vidas possam brotar da vida em si, e o amanhã não seja igual ao hoje.
36 mulheres foram assassinadas desde 2017 até Junho, que número poderemos esperar em Dezembro? Receio que seja ainda mais penosa esta estatística por essa altura.
Os problemas de todos não fazem férias, não pausam, nem a ampulheta da vida se compadece de vontades momentâneas de entupir o pequeno veio de areia que se esvai a cada segundo, tornando perpétuo um ciclo que se finda apenas com a morte.
É necessária uma sensibilização forte aos agressores, antes de o serem, e igualmente às vítimas, também antes de o permitirem. Porque, em bom rigor, uma vítima, por norma, já o é há algum tempo, condescendendo reiteradamente na agressão, desculpabilizando o evento, permanecendo sob o jugo grosso e desumano do agressor. Por necessidade, por amor incondicional, por incapacidade, muitas serão as possibilidades. Mas é importante em igual dimensão que o agressor seja sensibilizado para a não aceitação desta prática, assim como é importante que a vítima seja conhecedora da existência de soluções. Elas existem, em cada Concelho, Freguesia por vezes, Distrito e estão prontas a funcionar. Desde as forças da autoridade a toda uma rede de apoio à saída da situação em que se encontra e vislumbrar novas realidades, nova vida. A inércia é a maior companheira dos tristes desfechos.
De igual modo, quem de algum forma tem conhecimento destas situações, deve também, de forma pedagógica informar e reforçar a vítima para que se reerga e se posicione de forma ativa na resolução e não de forma passiva na sua própria morte.
36 mulheres foram assassinadas desde 2017, a maior parte delas em casa, onde os seus gritos terão sido mais abafados, mas perpetuar-se-ão pelas paredes.
É um crime que se esconde atrás de uma porta, dentro de um quarto, numa cozinha e sob o manto, muitas vezes, insuspeito do amor.
Que o amor pare de servir de desculpa para tais atos, e que estas mãos sejam orientadas antes de se perderem em vidas que se perdem.