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CASTELO DE ALMOFADAS

As crianças viram a rainha e de imediato desataram a correr na direção das almofadas com os seus risinhos estridentes que denotavam marotices.

Havia muito trabalho pela frente para receber aquela menina que estava prestes a chegar.

Construir um castelo de almofadas tinha sido a tarefa que se propuseram realizar.

Mas enquanto o castelo era erguido, muitos outros deveres e afazeres ganhavam vida.

No reino de Todas as Palavras imperava a harmoniosa melodia vinda da viola de Rui, um dos poucos adultos que habitavam este local.

Há já muito que a rainha, do alto do seu longo vestido vermelho e cabelo dourado,  lhe tinha solicitado que não deixasse escapar uma única nota e que, pelos quatro cantos do mundo, a música serenasse e embalasse o ânimo de todos.

Neste lugar viviam Lara e Rodrigo.

Eram uma espécie de irmãos sempre às turras cujas discussões e confusões resultavam em belas aparições!

Rodrigo chegara ao reino num dia de tempestade.

Os céus cinzentos aliados aos seus olhos transparentes, incapazes de identificar as cores, impediam-no de ser diligente e caminhar corretamente.

Ao aperceber-se de tal provação, a rainha acolheu-o e ordenou de imediato que lhe fossem colocadas duas enormes esmeraldas facetadas no rosto.

A refração da luz refletida nas pedras preciosas permitia-lhe ver o arco-íris que povoava a humanidade.

Desde então, Rodrigo não mais largara os pincéis, suas armas de eleição para enfrentar o destino.

Submergia-os frequentemente nas flores que proliferavam coloridas e, expedito, com eles pintava as pedras, as caudas dos animais e muitas outras coisas mais.

Adquirira o hábito de correr atrás de Lara sempre que a via, longe ou perto.

Lara era a princesa do reino. Também ela ali tinha chegado sozinha em menina.

Detentora de uns longos cabelos negros ondulantes como a brisa da noite, desde cedo reparara que das árvores daquele lugar brotavam letras que, dependuradas, aguardavam ser colhidas para juntas dar um novo significado a tudo o que existia no universo.

Os olhos escuros de Lara brilhavam incandescentes de cada vez que avistavam aqueles frutos sumarentos.

Rebelde e perspicaz, não deixava que o seu bonito vestido roxo com mangas de balão a impedissem de sobrevoar, no imenso espaço, as árvores.

Sonhava ter nas suas mãos todas as letras do firmamento e por essa razão, certo dia, inspirou com um só fôlego todo o ar que conseguiu e com as mãos delicadas subiu pelos ásperos troncos.

Tocou uma a uma as diferentes letras.

Uma a uma foram caindo na relva fresca e macia.

Ao vê-las cair, Lara libertou-se em vertigem rumo àquele tapete onde conseguia antever a magia.

Pousou no centro daquela que viria a ser a sua felicidade suprema e de imediato começou a sacudir as letras.

Tímidas, as letras começaram a dar as mãos para não se sentirem tão desprotegidas.

Não conheciam ainda os caminhos misteriosos que iriam percorrer e como tal acontecimento lhes traria assombrosas maravilhas.

Tendo reparado em tanta agitação, Rodrigo não perdeu tempo e borrifou agilmente as letras que juntas davam origem a palavras.

As palavras assustaram-se um bocadinho, porém, Rodrigo não desistiu.

Lara tentou ajudar as palavras e ordenou que fossem mais rápidas a percorrer o imenso jardim.

Deu-lhes as mãos e célere conduziu-as até à elevada construção almofadada que estava já quase pronta.

Rodrigo teve tempo e certeiro encheu-lhe o vestido de flores.

Entraram ambos no castelo e detiveram-se em silêncio olhando em redor pasmados.

A música ecoava baixinho, os fonemas estavam caladinhos, as pinceladas de aguarela escorriam lentamente e ao centro faziam-se soar cinco jograis.

Aníbal, Cátia, Margarida, Raul e Sandra empunhavam pergaminhos e neles liam o que tinha sido outrora as suas infâncias.

Em tempos idos, estas cinco curiosas crianças desafiaram os deuses mais antigos.

Por essa razão, tinham sido fadadas com a missão de lerem por toda a parte as aventuras infantis e a sua arte.

Os seus corpos cresciam enquanto o relógio abraçava sucessivamente as horas, mas permaneciam cativos das suas tenras idades agora e sempre, para todo o sempre.

As suas vozes doces declamavam suaves, lindas frases.

Aníbal, o mais crescido do grupo, tinha palmilhado quilómetros não fosse o seu nome escrito com a primeira letra do alfabeto.

No embalo de tão terno momento nunca antes vivido em tão longínqua fantasia, eis que surge à luz do dia o príncipe da noite, Rafael.

Rafael espelhava a cor da lua exibindo um cabelo branco com que iluminava e captava atentamente tudo em seu redor.

Nada lhe escapava: as cores, os sons, as rimas, os risos, o espanto, a admiração e tudo o resto naquele belo serão.

E foi então, que entraram de rompante três crianças em modo vibrante.

Daniela, princesa gatinha com sua aura fofinha.

Alexandre, príncipe ladino um saltitão feito menino.

Soraia, princesa de cabelo encaracolado onde escondia um segredo bem guardado.

Em uníssono, anunciaram:

– Ela está a chegar! Ela está a chegar!…

– Quem? – ecoou um burburinho pelo grande salão do castelo.

E com pozinhos de perlimpimpim esta história não chegou ao fim…

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