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ESTRANHO MODELO DE ASFALTO ASIÁTICO

Falam agora de uma autoestrada em Bissau, que vai ligar a capital a Safim, menos de uma vintena de quilómetros com três faixas de cada lado e, se calhar, até com uma portagem para assinalar a modernidade.
Eu até que nem desgosto de autoestradas, mesmo se só de duas faixas, não é isso. Mas gosto muito mais de estradas asfaltadas, daquelas só com uma faixa de cada lado. Ou até me basta uma picada bem tratada, sem crateras, para ficar feliz.
Na Guiné-Bissau as estradas existentes contabilizam cerca de 800 km mas mais de dois terços poder-se-á dizer que o foram um dia. Nos tempos que correm não passam de um pesadelo para quem as deve percorrer diariamente. As de alcatrão estão minadas de buracos que se tentam ultrapassar com recurso a carreiros alternativos pela berma. Mas é preciso que não tenha chovido, pois nesse caso há que aguentar os solavancos e ter fé na suspensão. Mas demasiada confiança (ou fé) deixa muitas vezes os carros de transporte que vêm do Senegal ou da Gâmbia em apuros ou em muito mau estado. Num troço de 10km passei este fim de semana por dois camiões avariados no meio da estrada, um ainda cheio de mercadoria, o outro com dezenas de baldes de tinta derramados no chão.
Nas picadas não é maior a sorte. Muita chuva a cair em abundância este ano e até tarde transformaram estas bonitas estradas guineenses num verdadeiro problema. Os carros circulam a passo de caracol, à procura de um pouco de chão firme e são facilmente ultrapassados pelas motas tão em voga na zona norte do país, que mais facilmente encontram piso favorável a apenas duas rodas.
Neste bonito país, que já percorri de norte a sul e este a oeste, e saindo do perímetro de Bissau, apenas a estrada que liga Mansoa à jangada que atravessa o rio para Farim se pode dizer digna desse nome. Bem alcatroada, marcações visíveis, bermas, até passadeiras. Tudo o resto são quilómetros de asfalto a necessitar de manutenção urgente, ou ainda mais quilómetros de picadas deterioradas que isolam povoações e as votam ao esquecimento total. Escusado será que em tempo de chuvas, muitos transportes públicos -os toca-tocas – que servem as aldeias que bordam essas picadas não se predispõem a trabalhar por receio de atolar ou de avarias bem mais graves. E as pessoas para ali ficam…
É por isso que me impressiona o entusiasmo com a ideia de uma autoestrada que ligará Bissau a Safim, a povoação mais próxima da capital e que funciona como uma espécie de zona industrial da cidade. Um investimento pouco compreensível quando a prioridade deveria passar por dar condições mínimas às populações para poderem circular de forma segura no pais (o que pressupõe naturalmente apostar também na requalificação da via Bissau-Safim) e poderem aceder aos serviços mais básicos como um centro de saúde ou um hospital em tempo útil.
O desenvolvimento não passa por 6 vias asfaltadas para percorrer menos de duas dezenas de quilómetros, passa sim por uma rede de estradas com o mínimo de condições e que cubra o país todo servindo a população sem distinguir nem discriminar em função da geografia ou da sua condição rural ou urbana.  Quando isso for uma realidade, até eu me congratulo com esta estranha generosidade asiática de oferecer uma autoestrada à Guiné-Bissau.

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