O dia 4 de Março de 2001, foi dos momentos mais desconfortáveis do tempo em que estive na vida política ativa, tendo percebido nessa noite, a total inoperância e inaceitável falência do Estado, na conservação de uma infraestrutura pública. Ainda hoje recordo o momento com estupefação, interrogando-me, como foi possível. Era um domingo e tal como nas semanas anteriores, esse final de inverno, tinha sido particularmente chuvoso. Estava em Cabeceiras de Basto e como habitualmente, preparava-me para iniciar no dia seguinte pela manhã, a viagem para Lisboa, onde desempenhava as funções de deputado à Assembleia da República e integrava a Comissão Parlamentar do Equipamento Social. Quando comecei a visualizar a notícia em rodapé, da queda da Ponte de Entre os Rios, na SIC/Notícias com o desaparecimento de um autocarro, que teria caído ao rio, percebi de imediato, a gravidade da situação. Estive acordado até às duas da manhã acompanhando a situação, telefonei a alguns colegas para tentar saber desenvolvimentos e quando acordei, às 8 horas, percebi que tinha caído o Ministro (Jorge Coelho) e seis secretários de Estado, da área do equipamento social. Dias depois de se saber que a corrente do Rio Douro tinha “engolido” um autocarro com 59 pessoas que regressavam a casa depois de um passeio às “Amendoeiras em flor”, tive oportunidade de juntamente com a Comissão Parlamentar do Equipamento Social, visitar o local e o que tinha restado da velha ponte inaugurada no século XIX, em 1887.
As imagens da desgraça correram mundo e nas semanas seguintes, ordenaram-se inspeções a cerca de 1500 pontes existentes no país, para assegurar que a tragédia não se repetiria.
Quase 18 anos depois, o país assiste atónito a nova tragédia, desta vez em Borba, com a derrocada da antiga estrada nacional 255, que “atira” cinco pessoas para o fundo de uma pedreira desativada.
Mas será que aprendemos alguma coisa com a tragédia de Entre-os-Rios?
Imagens impressionantes chegaram a 19 de Novembro da Estrada, que liga Borba a Vila Viçosa cujo abatimento arrastou para o fundo de uma pedreira alegadamente desativada, supostamente 5 pessoas, três das quais continuam ainda hoje, desaparecidas e onde, até há poucos dias, circulavam autocarros de turismo. Estas imagens, ainda que noutra escala, trazem-nos à memória a tragédia da queda da Ponte de Entre-os-Rios.
A questão é: como é possível darem licenças para pedreiras laborarem à margem de uma estrada, onde passam pessoas e viaturas?
Quem permitiu que a pedreira se aproximasse da estrada?
Como é que esta estrada, onde já não passavam camiões por razões de segurança, continuava aberta à circulação?
A Estrada teria passado alegadamente para o domínio Municipal. Quem assume agora a responsabilidade pela tragédia?
À boa maneira portuguesa estamos perante mais um caso, que nos devolve à lembrança a crónica falta de manutenção e fiscalização de algumas infraestruturas públicas, própria de uma administração burocrática e de um país excessivamente centralizado no “Terreiro do Paço”, com o interior sempre abandonado à sua sorte.
Em resumo: não aprendemos nada com a tragédia de Entre-os Rios.