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Cidadania e Sociedade

O YOUTUBE E OS DIREITOS DE AUTOR

Lembro-me de estar a cursar a parte curricular do mestrado em Coimbra, há 15 anos, e ouvir falar sobre a complexidade do direito digital e o conflito entre a internet e o direito de autor.

Hoje, volvidos tantos anos, o tema do Direito Digital está cada vez mais polémico.

Em novembro, com a aprovação da proposta da diretiva contra a pirataria online, o direito de autor manteve-se no centro da polémica.

Ocorre que a internet está para o direito como a lebre está para a tartaruga. Por mais que o legislador se esforce em regular, normatizar e controlar o que é feito no universo virtual, os ilícitos e as formas de os cometer têm ultrapassado qualquer controlo possível.

Com a internet a avançar à velocidade da luz, o legislador está a tentar ser mais criativo que os criadores das obras, para impedir que uma obra original registada seja utilizada sem autorização do proprietário.

O mundo virtual evoluiu muito nos últimos 15 anos, mas o direito digital rasteja-se em meio a uma luta que confronta grandes multinacionais norte americanas, como o Facebook e o Google, e a indústria de conteúdos na Europa.

Na semana passada ouvi o meu filho, de 12 anos, afirmar assustadíssimo: “se o artigo 13.º entrar em vigor, a chefe do YouTube disse que o Google e o YouTube vão sair da Europa!”.

E quando eu tentei explicar que o direito de quem cria precisa ser salvaguardado, o meu projeto de gente, que se considera youtuber, contrapôs: “mãe, todas as imagens que estão no Google são feitas por alguém, assim nunca mais poderei usar uma imagem ou um jogo no meu canal”.

É que eu nem tive direito a réplica, o lobbying dos youtubers e o próprio YouTube, através da sua “chefe” Susan Wojcicki, já disseminaram o pânico entre os internautas. “Mãe, tens que ser contra o artigo 13.º”.

E o meu youtuber (que aos 7 anos declarou que não queria ser advogado ao ouvir, através do bluetooth do carro, uma cliente cuja sentença de divórcio havia sido decretada, dizer feliz que o ex-marido me odiava: “não quero uma profissão em que as pessoas me odeiem”), continuou a “advogar” a favor da “chefe” do YouTube.

Mas para que se continue com o “julgamento” ao falado artigo 13.º, é preciso compreender o que é e o que protege o direito de autor e a sua obra.

Direito de autor é um direito fundamental do homem, consagrado na Constituição da República Portuguesa. É um ramo do Direito Civil.

A proteção conferida pelo direito de autor é reconhecida em todos os países da União Europeia, nos países subscritores da Convenção de Berna para a Proteção de Obras Literárias e Artísticas e nos países membros do Tratado OMPI (Organização Mundial da Propriedade Intelectual).

O direito de autor abrange direitos de carácter patrimonial e direitos de natureza pessoal, denominados direitos morais.

Segundo a lei, no exercício dos direitos de carácter patrimonial o autor tem o direito exclusivo de dispor da sua obra e de fruí-la e utilizá-la, ou autorizar a sua fruição ou utilização por terceiros.

Independentemente dos direitos patrimoniais, e mesmo depois da transmissão ou extinção destes, o autor goza de direitos morais sobre a sua obra, designadamente o direito de reivindicar a respetiva paternidade e assegurar a sua genuinidade e integridade.

Assim, a União Europeia está focada em determinar a criação de regras para proteção do autor e das suas obras nas plataformas informáticas como o Google, o YouTube, o Facebook, o Twitter e o Instagram.

As obras são as criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, por qualquer modo exteriorizadas, que, como tais, são protegidas nos termos do Código do Direito de Autor, incluindo-se nessa proteção os direitos dos respetivos autores.

É natural que a presidente executiva do YouTube declare aos quatro ventos que será difícil executar a diretiva da União Europeia.

É também natural que os opositores da diretiva a vejam como uma “máquina de censura” e que com a sua “máquina de manipular opiniões” consiga uma adesão contra o combate à pirataria digital.

Ora, uma “máquina de fazer dinheiro” como o YouTube terá de gastar muitos mil dos milhões que ganha para cumprir a diretiva e celebrar acordos de licenciamento justos e adequados com os titulares de direitos.

Terá ainda de criar mecanismos de reclamação e recurso céleres e eficazes para os utilizadores.

Uau! Controlar o que entra na plataforma sairá caro! Mas não se pode vender fatias de bolo sem comprar os materiais para o fazer.

Em defesa da desresponsabilização do YouTube sobre o que os utilizadores carregam na plataforma, a sua “chefe”Wojcicki, declarou que a empresa ajuda os criadores de conteúdo. Realmente são muito altruístas.

Wojcicki informou que em 2018 o YouTube pagou 800 milhões de euros aos artistas europeus com conteúdo na plataforma. Esqueceu-se de dizer quanto ganhou.

É de conhecimento público que só pode carregar um conteúdo (músicas, vídeos, jogos e ilustrações) quem o criou ou quem esteja autorizado a utilizar. Mas o efeito dissuasor para o infrator é quase nulo.

Os eurodeputados querem que os utilizadores que fazem o upload sejam responsabilizados juntamente com a plataforma.

Carregar conteúdos de terceiros sem a devida autorização é violação de direitos de autor e o próprio YouTube anuncia que poderá encerrar o canal de quem viole a lei. Mas atualmente o controlo não é eficaz.

A plataforma vem tentando, sem muito sucesso, filtrar e controlar para proteger o direito de autor ao mesmo tempo que tenta motivar a criatividade e gerar receita.

Mas os eurodeputados querem o “fim do faroeste digital” em defesa da indústria criativa na Europa.

Assim, caso as plataformas e as entidades que gerem os direitos de autor não cheguem a um consenso, será obrigação das plataformas assegurar que os conteúdos protegidos não sejam disponibilizados.

Tentei explicar ao meu pequeno youtuber que a diretiva tenta proteger a todos, numa esfera difusa, dando a César o que é de César.

Esperemos por 2019 para conhecer a versão final da diretiva que regulará os direitos de autor no mercado único digital    

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