Lara Guerreiro
Estamos constantemente a ouvir falar dos alimentos ditos processados (eu estou sempre a falar/escrever sobre eles…), usualmente conotados de forma negativa com a nossa saúde, mas será que sabemos o que realmente são? Será que são evitáveis? Será que são todos iguais? Vamos lá tentar esclarecer.
Também chamados de “industrializados”, os alimentos processados são, por definição, todos os alimentos que não são naturais, isto é, que sofreram algum tipo (ainda que pequeno) de alteração da sua forma natural, isto é, algum tipo de processamento. Pode, por isso, variar entre uma simples alface que foi alterada da forma original, disponibilizada ao consumidor lavada e cortada, e um pastel de bacalhau congelado pré-cozinhado; são ambos processados, porém, distintos em nutrientes e em efeitos na nossa saúde. A fama negativa que têm advém, pois, da frequente adição de sal, açúcar e/ou gorduras no processamento que, como tão bem sabemos, estão associados à obesidade e doenças crónicas (hipertensão, diabetes, cancro…).
Já agora, este artigo não é só para os outros… Ainda que não tenha consciência disso, os alimentos processados também fazem parte da sua vida e da vida da sua família, já que os padrões de consumo alimentar de uma sociedade industrializada dificilmente se coadunariam com a utilização em exclusivo de alimentos in natura (naturais, sem qualquer tipo de manipulação). Para a grande maioria de nós, os dias são uma corrida, com muitas horas fora de casa e a “falta de tempo” uma queixa comum, sobrando pouco para nos dedicarmos como gostaríamos ao planeamento e à preparação de todas as refeições do dia seguinte. Astuta, a indústria alimentar respondeu de pronto com novas preparações e tecnologias de processamento dos alimentos que resultaram em grande diversidade de escolhas alimentares disponíveis, práticas, duráveis, saborosas (viciantes?) e acessíveis (baixo custo): os alimentos processados.
Mas ainda que não lhes possa fugir, não se assuste, pois os alimentos processados não são todos iguais, variando, e muito, no seu grau de processamento. Neste âmbito, utiliza-se usualmente o sistema NOVA (nome, não acrónimo), aceite como o mais coerente sistema de classificação dos processados, agrupando-os, não por nutriente, mas por nível de processamento. São 4 grupos de alimentos, num espectro que se estende dos alimentos não processados aos mais processados, os ultra-processados:
Não processados ou minimamente processados: incluem partes de plantas ou animais que não foram industrialmente processados ou que foram alterados sem adição de outras substâncias (sem gordura, sal ou açúcar, por exemplo). Aqui incluem-se frutas e legumes, inteiros ou partidos, carne fresca ou congelada, ovos, leite, arroz e outros cereais, por exemplo.
Ingredientes culinários processados: substâncias extraídas de alimentos não processados, como o azeite, o óleo vegetal e o açúcar, ou obtidos da natureza, como o sal marinho.
Alimentos processados: são produzidos através da adição de sal, gordura e/ou açúcar, ou outros ingredientes culinários (incluindo aditivos alimentares) a alimentos minimamente processados. São, no fundo, versões modificadas de alimentos não processados e incluem itens como frutas ou vegetais enlatados, oleaginosas (frutos secos) salgados, carnes fumadas, iogurte e queijo.
Alimentos ultra-processados: são definidos como formulações industriais multi-ingredientes, geralmente contendo um baixo valor nutricional (baixo teor em fibra, vitaminas, proteínas, minerais, antioxidantes e/ou gorduras saudáveis) e uma elevada concentração de açúcares, farinhas refinadas (hidratos de carbono de absorção rápida), gorduras saturadas, gorduras trans, sal e/ou inúmeros aditivos (conservantes, emulsionantes, intensificadores de sabor, estabilizantes, aromatizantes, edulcorantes artificiais…) e incluem refrigerantes, pão embalado de longa duração, biscoitos, bolachas, snacks salgados, caldos concentrados, molhos tipo ketchup, patês, enchidos, snacks doces, gelados, cereais de pequeno-almoço e refeições pré-preparadas (pizzas…).
Sem surpresa se percebe que os alimentos ultra-processados são, de longe, os mais nefastos em matéria de degradação da saúde, estando o seu consumo associado ao aumento do risco de obesidade, hipertensão arterial, diabetes tipo 2, doenças cancerígenas e colesterol elevado. Associação inversa encontramos entre o consumo especifico de alimentos não processados ou minimamente processados, nomeadamente os cereais na sua forma integral, frutas e hortaliças, ou mesmo nalguns ditos processados, como iogurtes e queijos, desde que se evitem ingredientes como o sal ou o açúcar adicionados. Não existem dados que permitam caracterizar com clareza o consumo de alimentos ultra-processados, mas se pensarmos bem no que se passa em nossa casa ou, pelo menos, ao nosso redor, talvez cheguemos a consumos assustadores, superiores a 50% de ultra-processados no total de alimentos consumidos ao longo do dia. No mínimo, é alarmante!
Já agora, este alerta não é só para os outros… Se fugir aos ultra-processados lhe parece fácil, não é, mesmo que seja um consumidor informado e atento. Poderemos ser induzidos em erro na compra um preparado com alimentos ditos saudáveis, que até estão na moda, como a quinoa, as sementes, o tofu ou os vegetais em geral, comprando ingenuamente saladas de quinoa, salteados vegan, barritas de sésamo, pão de espelta embalado, lasanhas de vegetais, por exemplo, como sendo saudáveis, quando na verdade são tão ultra-processados, com tanto sal, gordura saturada, aditivos e calorias, como uma pizza ou uns rissóis pré-cozinhados. Até os cereais de pequeno-almoço integrais que dá ao seu filho podem ser, veja-se, um ultra-processado.
Como sabemos, então, se é muito ou pouco processado? Além do óbvio, que será a escolha, sempre que possível, dos alimentos na sua forma mais natural possível, só nos podemos defender com a leitura rápida (porque não temos o dia todo para andar no super-mercado a ler rótulos) da lista de ingredientes: a regra é quantos mais, mais processado…
Como nos defendemos?
Mesmo com o pouco tempo que nos sobra, podemos e devemos, pela nossa saúde, fazer um esforço para comer de forma mais natural, recorrendo aos alimentos in natura e minimamente processados, e até alguns processados sem adição de açúcar, sal ou outros ingredientes prejudiciais, evitando ultra-processados a todo o custo.
Aqui ficam alguns exemplos de trocas inteligentes:
- Pão de forma por pão do dia;
- Frutos secos fritos/salgados por frutos secos ao natural;
- Iogurtes aromatizados por iogurtes naturais;
- Vegetais enlatados por congelados (se não for possível em fresco…);
- Batatas fritas de pacote por vegetais/fruta desidratados;
- Caldos de condimentos por especiarias e plantas aromáticas frescas ou desidratadas;
- Muesli de compra por muesli feito em casa;
- Cereais de pequeno-almoço por aveia ou pão do dia;
- Bolachas por tostas de cereais sem sal.