Terminou ontem o mês em que a saudade pulsa, mais forte, no meu peito.
Algumas pessoas dizem que sou mais triste nesse mês, a verdade é que sou mais saudade.
A ironia do mês em que desponta a Primavera,do desabrochar das flores, do preparar os galhos para a extensão da vida, de nascimento, é que é um mês que me recorda a partida.
Perdi no mês de Março o meu avô materno, e ainda era inverno. O meu padrinho decidiu partir na véspera em que o meu primeiro filho nasceu, viveu e morreu. Já era primavera, então.
No meu peito, não.
Perdoem-me o silêncio maior, deste mês. As feridas curam, mas a memória não sara.
Hoje, reli um e-mail enviado pelo meu querido amigo Pe Alípio, enviado no dia em que fez anos de vida e morte o meu primeiro filho, a minha estrela.
No conteúdo agradece-me um poema que escrevi no dia da morte da sua querida mãe, dedicado a ela. Dedicado à vida.
Eu não sou boa em proferir palavras perante a perda, então tento escrever.
Aliás, foram as perdas que me empurraram para a escrita.
Reler essas palavras fez com que eu chorasse , não de tristeza, mas de orgulho: ele agradeceu-me o bem que o poema que escrevi para eles, lhe faz. As palavras dele, fizeram-me bem, também.
Porque afinal a primavera também é o amor, a amizades, o jardim que habita no nosso interior.
Grata sou a todos que me ajudam a cuidar do meu jardim.
Deixo o poema da Mãe do Padre Alípio, que partiu, e é primavera:
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É outono na primavera
e nem é essa a estação
A vida brota, num impulso de coragem,
e luta contra a força do solo que a desconhece.
A semente pequena que vence a primeira batalha.
Vê gigante o mundo
sente-se pequena.
Segue crescendo,
e antes de ser flor
saberá de espinhos,
de dor.
De amor.
Segue crescendo
e antes de ser árvore
brincará de ser fruto.
Será filha e será mãe.
Será mãe dos filhos dos filhos.
Será filha dos que foi mãe.
Segue crescendo
e verá as suas sementes
serem flor pela primeira vez.
Verá os frutos dos seus frutos
serem árvores.
E no solo com o qual lutou para nascer
Haverá sombra, pedaços de sol e sementes.
A semente cresceu
e gerou a floresta.
Uma fruta madura jogada do Céu.
Deixa mais rico o mundo
que a acolheu.
E a última flor
Deus a colheu.
Cidália Pinto – Vila Boa De Quires, 20 Julho 2018