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A CIDADE E OS AFETOS – ESSÊNCIA E SIGNIFICADO

Mateus Oliveira

Nunca como agora tivemos – decisores políticos e arquitectos, enquanto supostos actores principais na construção e transformação da cidade – ao nosso dispor uma panóplia tão abrangente de instrumentos que nos permitam criar cidades capazes que, efectivamente, melhorem a qualidade de vida de todos os que as habitam e frequentam, em trabalho ou lazer.

Paradoxalmente, nunca como agora se dinamizaram – num jogo de “nós fazemos mais que o vizinho” – tantos eventos e, na sua grande maioria, tão vazios de essência. Nunca se viveu tanto a “Disneyficação” (apropriando-me do termo de Neil Leach, no seu genial “A Anestética da Arquitectura) das cidades. O advento da comunicação, como um dos paradigmas da sociedade actual, tem este lado perverso que é, também nesta temática, mais explorado que o lado “bom” deste tão necessário paradigma.

Deste modo, nunca como agora, as cidades se tornaram tão embriagantes e superficialmente sedutoras… e, no entanto, tão vazias de vivências que carreguem efectivo significado; que potenciem a memória colectiva/individual e a história da própria cidade; que proporcionem interacções sensoriais com o espaço; e que valorizem a sua dimensão humana e inclusiva.

Impõe-se pois que esta cultura de consumo apropriação vazia da cidade seja o mote para a transformação real da cidade através de uma reflexão efectiva e afectiva da relação e das relações com e no espaço urbano, abolindo, paulatinamente, as estratégias de sedução imediatas que se materializam em espaços vazios de significado cujo propósito final é a diminuição da consciência crítica de quem, diária ou pontualmente, vive as cidades.

Aos arquitectos, pela inevitável relação de comprometimento que a arquitectura tem com a imagem, cabe o papel e a capacidade criativa de abolir a criação de obras arquitectónicas vazias de sentido, comprometidas com a essência do que é efectivamente ARQUITECTURA na materialização de espaços com significado, que valorizem, respeitem e potenciem a realidade que os envolve. E, simultaneamente, descomprometidas de relações que os tornem marionetas ao serviço de quem, muitas vezes, não percebe que a arquitectura é, antes de mais, serviço público. Só assim seremos capazes de responder – taxativa e inequivocamente – ao que os futuros utilizadores esperam e merecem por parte daquilo que desenhamos. Sendo que, cada vez mais, estes utilizadores devem ser valorizados e tidos em conta como agentes activos em todo o processo da criação arquitectónica; e aos agentes decisores o papel de defensores, efectivos, do interesse público acima de todo e quaisquer aprumo de realização pessoal. Só assim as cidades se permitirão transformar naquilo que, desde sempre, constituiu a sua essência: lugares que têm a capacidade de responder aos desejos, subjectividades e necessidades de todos.

As cidades, através da arquitectura, têm de ser – mais do que nunca pelas vicissitudes da sociedade actual – espaços de vivências significativas, de sonhos, de estórias e de memórias… espaços com sentido e para os sentidos… em suma, espaços de afectos.

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