Rui Canossa
Celebramos hoje, data da publicação desta crónica que escrevo em liberdade, o 1º de maio que é o Dia do Trabalhador, data que teve origem na primeira manifestação de 500 mil trabalhadores nas ruas de Chicago, e numa greve geral em todos os Estados Unidos, em 1886.
Três anos depois, em 1891, o Congresso Operário Internacional convocou, em França, uma manifestação anual, em homenagem às lutas sindicais de Chicago. A primeira acabou com 10 mortos, em consequência da intervenção policial. Foram os factos históricos que transformaram o 1 de maio no Dia do Trabalhador. Até 1886, os trabalhadores jamais pensaram exigir os seus direitos, apenas trabalhavam.
No dia 23 de abril de 1919, o Senado francês ratificou as 8 horas de trabalho e proclamou o dia 1º de maio como feriado, e uns anos depois a Rússia fez o mesmo. No Brasil é costume os governos anunciarem o aumento anual do salário mínimo no dia 1 de maio.
No calendário litúrgico celebra-se a memória de São José Operário por tratar-se do Santo padroeiro dos trabalhadores.
Em Portugal, os trabalhadores assinalaram o 1.º de Maio logo em 1890, o primeiro ano da sua realização internacional. Mas as ações do Dia do Trabalhador limitavam-se inicialmente a alguns piqueniques de confraternização, com discursos pelo meio, e a algumas romagens aos cemitérios em homenagem aos operários e ativistas caídos na luta pelos seus direitos laborais.
Com as alterações qualitativas assumidas pelo sindicalismo português no fim da Monarquia, ao longo da I República transformou-se num sindicalismo reivindicativo, consolidado e ampliado. O 1.º de Maio adquiriu também características de ação de massas.
Até que, em 1919, após algumas das mais gloriosas lutas do sindicalismo e dos trabalhadores portugueses, foi conquistada e consagrada na lei a jornada de oito horas para os trabalhadores do comércio e da indústria.
Mesmo no Estado Novo, os portugueses souberam tornear os obstáculos do regime à expressão das liberdades. As greves e as manifestações realizadas em 1962, um ano após o início da guerra colonial em Angola, são provavelmente as mais relevantes e carregadas de simbolismo. Nesse período, apesar das proibições e da repressão, houve manifestações dos pescadores, dos corticeiros, dos telefonistas, dos bancários, dos trabalhadores da Carris e da CUF. No dia 1 de maio, em Lisboa, manifestaram-se 100 000 pessoas, no Porto 20 000 e em Setúbal, 5000.
Ficarão como marco indelével na história do operariado português, as revoltas dos assalariados agrícolas dos campos do Alentejo, com o grande impulso no 1.º de maio de 62.
Mais de 200 mil operários agrícolas, que até então trabalhavam de sol a sol, participaram nas greves realizadas e impuseram aos agrários e ao governo de Salazar a jornada de oito horas de trabalho diário.
Claro que o 1.º de maio mais extraordinário realizado até hoje, em Portugal, com direito a destaque certo na história, foi o que se realizou oito dias depois do 25 de Abril de 1974.
Este ano celebrámos o 25 de abril de uma forma diferente. Contidos, em estado de emergência, preocupados com o presente e com o futuro e sem o podermos fazer juntos.
Parece um paradoxo comemorar o Dia da Liberdade sem ela, mas é exatamente por ela, a Liberdade, que não podemos deixar passar em claro esta data, estas datas.
Primeiro, porque o 25 de abril nos trouxe um dos maiores bens que o Ser Humano pode usufruir enquanto cidadão: a Democracia!
Não há regimes políticos perfeitos, bem pelo contrário, mas sem dúvida que a Democracia é o melhor, o mais avançado, o mais solidário e o mais completo dos Direitos, Liberdades e Garantias.
Também porque “abril” e Democracia, são sinónimos de Cidadania. Não é mais nem menos do que a prática de direitos e deveres que nos competem enquanto membros e agentes transformadores da Sociedade.
Sem a prática da Cidadania e sem esse equilíbrio entre os tais direitos e deveres, não há sociedades justas nem desenvolvidas.
Mas Liberdade implica sobretudo Responsabilidade. Pessoal, para cada um de nós e política para quem nos governa, ou para quem esteja na oposição.
Ser responsável a este nível, significa valorizar e qualificar a Democracia. Significa contribuir para o bem comum!
Imagine-se o que seria esta pandemia em Portugal se todos nós, Portugueses, não estivéssemos a ter um comportamento exemplar e altamente responsável!
Se cada um de nós não sentisse a responsabilidade de ajudar e de proteger quem está à nossa volta, muitas vezes vulnerável e em solidão. É por isto que responsabilidade significa muitas vezes, solidariedade.
Este ano o dia da Democracia, da Liberdade, da Cidadania, da Responsabilidade e solidariedade foi passado em casa. Aguardando com serenidade dias melhores, mas com resiliência, esperança e coragem! A consciência cívica de cada um é que vai fazer a diferença. Para que possamos estar novamente juntos em liberdade.
Acabo com uma citação de alguém, que desde muito novo, me despertou o interesse pela Liberdade.
“O 25 de Abril foi, para todos nós, o fim da ditadura. Os heróicos militares que prepararam e executaram a revolta realizaram um acto de libertação de si mesmos, mas consigo mesmos quiseram libertar Portugal inteiro.”
Francisco Sá Carneiro