Mateus Oliveira
No momento em que escrevo esta breve crónica decorrem as eleições para Ordem dos Arquitectos. À hora a que a lerem as eleições estarão terminadas. Pela primeira vez envolvi-me um bocadinho mais no acto eleitoral que elege o presidente da OA. E, na sequência dessa decisão – e do que vou refletindo sobre Arquitectura – mergulhei numa reflexão antagonicamente simples e complexa: mas afinal o que é isto de ser Arquitecto? Saberei eu, pela enorme paixão que tenho pelo que faço e pela visão romântica que tenho da Arquitectura, ser capaz de exprimir por palavras aquilo que me define profissionalmente?
Bem, proponho-me a esse exercício convosco. E logo me darão a resposta. Imponho-me, no entanto, a abordar o tema – sobretudo – com o coração. Ignoro, hoje, o lado menos bonito inerente ao exercício de qualquer profissão que está muito dependente de decisões, públicas e privadas, de pessoas cuja sensibilidade para a disciplina é – muitas vezes – inexistente.
Tenho um orgulho imensurável em ser Arquitecto. Melhor, em sentir-me Arquitecto. Porque é diferente! Esse orgulho não está inerente ao título, porque esse não me define nem define ninguém e serei sempre, apenas e só, o Mateus. É algo de dentro. Inexprimível.
Olho hoje para a Arquitectura com um fascínio ainda maior do que aquele que, em 2006, estava carimbado – a sonhos e ambições – no diploma de conclusão de curso. Cresce em mim o deslumbramento inerente à chegada ao lugar do projecto para lhe sentir a essência, lhe conhecer a história, a memória e a identidade e estabelecer – com ele – um diálogo honesto de intenções. E encanta-me muito – mais a cada dia – o acto, quase sagrado, de pegar no lápis e na folha de papel para rabiscar as primeiras ideias daquilo que é, amiúde, o primeiro passo para a materialização do sonho de alguém e que, de forma natural e quase inconsciente, passa a ser nosso também. Esse prazer carregado de responsabilidade, particularmente intenso no projecto de casas, alimenta-me de uma forma que nunca serei capaz de traduzir em palavras.
E é, no fundo, esse prazer que me desafia a querer aproximar a Arquitectura das pessoas. Borrifando-me completamente para o prestígio individual e a cultura – vazia de essência – inerente ao conceito Starchitect, que desperdiça recursos e subverte tudo aquilo que deve ser o exercício da profissão. É esse mesmo prazer que me motiva a “perder” dias em diálogo constante com as pessoas que me procuram e que me confiam algumas das decisões mais importantes das suas vidas. Exijo-me percebê-los. E desenhar-lhes “lugares” com a mesma paixão como se fossem meus. Porque esta é a exigência intrínseca a uma profissão que se exerce através de vontades e de relacionamentos com tantas pessoas, com tantas disciplinas e a tantas escalas (do parafuso à cidade); de forma tão abstrata/artística quão – antagonicamente – rigorosa/científica; que é a representação física de dimensões culturais, que carrega, para o bem e para um mal, uma enorme responsabilidade social que exige ética e honestidade intelectual de cada um de nós e que tem de ser sempre um importante instrumento democrático; e que me faz encarar ideologicamente a profissão, em compromisso permanente com a essência daquilo que é a Arquitectura.
Em suma, que me faz querer contribuir para que a Arquitectura e os Arquitectos saibam estabelecer uma relação empática verdadeiramente genuína com a sociedade.