Luís Sousa
Há uns tempos trocava umas impressões com um amigo a propósito de chegas de bois na serra de Montemuro, o quanto é aquela uma tradição que se perde no tempo e que as populações orgulhosamente vão mantendo para que os mais jovens as possam vivenciar. Hoje vemos os nossos campos abandonados, mas num passado bem recente o seu amanho era imprescindível para o sustento de grande número de famílias. Rara era a quinta que não tivesse a sua parelha de bois, fundamental para amenizar o esforço braçal. As igrejas românicas, elementos centrais na estruturação medieval do território do Entre Douro-e-Minho, não escassas vezes revelam esculturas de bovídeos. É certo que estes surgem carregados de simbologia, mas estão lá também para vincar o quão importante era a sua presença na vida quotidiana campesina.
Nos inícios dos anos 1990, uniu-se, como até então não se havia visto, a comunidade civil e científica. Dado que poria em causa a preservação de um conjunto ímpar de gravuras rupestres identificado ao longo das margens do rio Côa, o propósito da contestação foi o de proibir a concretização do projeto de construção de uma barragem de produção de energia elétrica.

A Edição Especial Viagens nº 19, da revista National Geographic, é consagrada a «50 Maravilhas de Portugal». Os «Sítios de Arte Rupestre do Vale do Côa» é uma dessas maravilhas. E por falar em maravilhas, por estes dias voltou a agitação àquela região, pois no sítio do Fariseu foi encontrada ao ar livre uma gravura rupestre do Paleolítico Superior onde aparece representado um auroque, um boi selvagem já extinto. A gravura, que ocupa um painel com aproximadamente 6 metros de comprimento, tem mais de 3,5 metros de comprimento e será datada de cerca de 23 mil anos, tendo a curiosidade de tratar-se de uma das maiores gravuras rupestres do mundo.
Cerca de 30 anos depois, o Vale do Côa continua a deslumbrar-nos com as suas descobertas. A classificação como Património da Humanidade pela UNESCO, em 1998, veio comprovar porque razão as gravuras não sabiam nadar!