Rui Canossa
Ainda a vivermos a crise sanitária provocada pelo COVID 19 e a crise económica que fez recuar o PIB e o aumento do desemprego para além dos 8%, estaremos agora nas vésperas de uma crise política? O nosso primeiro ministro vai começar a fazer negociações à esquerda, até porque tem um orçamento de Estado para apresentar até 15 de outubro. O Governo vai fazer cedências com os partidos à esquerda, já que António Costa veio a público dizer que não quer nada com o PSD. Agora, também se sabe que o défice orçamental vai ter de diminuir, pois este ano excecional como foi vai ser permitido que aquele ultrapasse os 10% do PIB, mas, o próximo ano vai ter de mostrar, por um lado a recuperação do crescimento económico e também, da diminuição do défice orçamental, de novo, para os 3% do PIB. O que não vai ser fácil, diga-se, porque pelo lado da despesa, o aumento as despesas sociais com o subsídio de desemprego vamos ter crescimento das despesas sociais e com a saúde, e, por outro lado a queda das receitas, nomeadamente, do IVA, do IRS e do IRC. Agora surge o problema, pois o acordo anterior com a esquerda tinha a ver com a valorização do trabalho, nomeadamente, aumentos da função pública e com as progressões das carreiras e novas contratações. Desta forma estaríamos perante um aumento da Despesa pública rígida, já que há uma resistência à baixa dos vencimentos da função pública. Por outras palavras, como é que o Governo PS vai negociar com os seus parceiros da geringonça de forma a não estragar a relação. Vai ter de haver cortes na despesa e isso não agrada aos parceiros. Uma hipótese, ténue, é que as negociações não se façam pela via orçamental, ou seja, mais despesa, por exemplo com mais contratações, mas sim pela via legislativa, de maior proteção do trabalhador. Como isso implica uma concertação social envolvendo os empresários, esta via parece-me mais difícil. Mas a líder do Bloco, Catarina Martins, já veio a público dizer que há um ponto fulcral que é o da contratação de pessoal para a saúde.
Com tanto alarido, António Costa ameaça bater com a porta, o que obrigaria o Presidente a marcar novas eleições antecipadas. Compreende-se, o Primeiro Ministro dramatiza para forçar um acordo. Ora isto também não agrada aos parceiros porque isso poderia significar a maioria absoluta para o PS e a sua perda de capacidade de influência. Devo dizer que a jogada do Governo em ganhar maioria absoluta também era extremamente arriscada em caso de não a conseguir porque aí, com uma maioria simples, seria uma derrota política retumbante, muito arriscado. É o estratega a funcionar. A crise política agradaria a António Costa, mas, Marcelo Rebelo de Sousa já veio a público dizer que uma crise política ia arrastar em quatro meses a incerteza política o que em termos económicos não é salutar. Ninguém acredita neste cenário. Se houvesse de facto, uma crise política só em maio de 2021 e novo Governo para junho, o país iria aguentar um Governo de gestão atá ao verão? Mais de meio ano, em plena crise, em tempo da presidência portuguesa da União Europeia. Como resultado, o mais provável é a abstenção dos partidos à esquerda, viabilizando assim o Orçamento de Estado.
E o PSD no meio disto tudo? Com a possibilidade de não haver uma redução da carga fiscal, o que muito agradaria ao PSD, o partido vai atirando críticas ao Governo, desde o conflito com a Ordem dos Médicos, com a autorização da realização da Festa do Avante que, vai mesmo avante com o que se passa com o Novo Banco, e sobretudo, com o novo recorde da dívida pública portuguesa que está agora (julho) nos 264.665 milhões de euros o que equivale a 127.% do PIB, num período em que o PIB caiu 16.3%, mas que ainda se espera chegue aos 134.4% do PIB. Daí se compreenda o nervosismo do primeiro ministro quando chegou de férias.