José Castro
Longe vai o tempo em que os “especialistas” afirmavam que era impossível algo mais pesado que o ar, voar. Não abordando balões, dirigíveis ou helicópteros, os aviões são hoje uma das formas mais seguras e rápidas de viajar. Curiosamente, quer os brasileiros quer os portugueses tiveram um papel importante na aviação: os primeiros com Alberto Santos Dumont, alegadamente o primeiro a voar em 1906 em Paris, e os segundos em 1922 com Sacadura Cabral e Gago Coutinho a fazer a primeira travessia aérea do Atlântico Sul.
A importância da aviação, sem ser em contexto militar (infelizmente), constata-se pelos muitos milhões de passageiros que recorrem a este tipo de transporte. Em Portugal, o número é crescente pois, dos 8.206.870 passageiros em 1993, passou-se para 55.007.894 em 2019. Nesse mesmo ano, na Europa, 1.034.152.227 de pessoas viajaram de avião. Obviamente que 2020 pelos motivos que conhecemos será um ano atípico.
Não há dúvida que na aviação reside o que há de mais evoluído em termos de conhecimento científico e tecnológico, onde continuamente se procuram contrariar (ou aproveitar) as leis da física. Se descolar é opcional, aterrar (por vezes amarar) é obrigatório e importa fazê-lo em segurança. A média de acidentes fatais na aviação em 2018 foi de um para cerca de três milhões de voos. Seja como for, a probabilidade de sobrevivência é superior se estiver sentado mais próximo da “cauda”, cumprir as normas de emergência, saber a que distância fica da zona de evacuação e utilizar sempre o cinto de segurança (turbulência não detetada atempadamente). Na Europa existem cerca de 9,3 vítimas de acidente de viação por cada cem mil habitantes. Não há dúvida que tem maior probabilidade de ter um acidente na viagem de automóvel que faz todos os dias de casa para o trabalho.
Apesar da parte racional saber que é mais seguro andar de avião, quando entramos dentro de um, a parte emocional fica algo “irrequieta”. Provavelmente todos nós nos lembramos da primeira viagem de avião. A minha, há bastantes anos atrás, foi na KLM. As instruções de segurança que sempre aprecio saber, foram ditas em inglês (língua que não domino) e pedindo ao meu colega de trabalho que as traduzisse, somente disse que elas apenas tinham efeito psicológico, pois, se o avião caísse, nada adiantaria! Apesar disso, teve a simpatia de trocar o lugar comigo para eu ficar junto à janela. Não deixa de ser curioso comparar o que se imagina que é voar de avião, com a realidade! Em alguns parâmetros a realidade ficou “atrás” da imaginação, em outros bem à frente. No que ficou atrás foi a sensação de velocidade e mesmo de aceleração! Com ausência de referencial (não temos as árvores a “andar para trás”) fica a impressão de “estar parado” mesmo quando dizem que vamos a cerca de 1000 km/h. Mesmo a descolar parecia que o avião custava a ganhar velocidade! Chegar de 0-100km/h na minha moto, mesmo sendo “velhinha,” parece que há uma aceleração superior! No restante, a realidade ultrapassou a imaginação. Observar as nuvens pelo lado de cima, iluminadas pelo Sol é uma imagem inesquecível. Simplesmente parecem algodão e apetece saltar em cima delas! Também observar o solo, quando já estamos próximos do aeroporto visualizando estradas e movimento, o mar e as ondas, é efetivamente mais um ponto interessante a acrescentar. Curiosamente é quando ao mesmo tempo pensamos que vamos nas alturas e que podemos …cair! A aterragem é sempre o último momento de tensão, mas tudo correu na perfeição, na minha primeira viagem. Apesar de tudo, quando colocamos os pés novamente fora do avião, é uma tremenda sensação de alívio!
O Dia Internacional da Aviação Civil ocorreu no passado dia sete de dezembro. Este pequeno testemunho da primeira vez que “voei” serve também para manifestar a minha gratidão a todos os profissionais que permitem que estejamos seguros “ lá em cima.” São muitos milhares de pessoas no “ar” e em “terra” que tudo fazem para as viagens se façam com todo o conforto e segurança. Muitas dessas profissões (pilotos, controladores aéreos, etc) são psicologicamente exigentes e uma pequena falha humana pode ditar um acidente fatal. Condições de trabalho, formação adequada, descanso suficiente e remuneração apropriada são requisitos fundamentais. Espero que apesar da crise que este setor (e quase todos os outros) está a passar, não haja motivo para despedimentos indevidos e exploração dos trabalhadores, pondo em causa a segurança de todos nós (mesmo daqueles que não andem de avião, pois não sabemos onde podem cair!).
Tudo passa, e, portanto, bons e diferentes momentos irão chegar. Um bom indicador é a possibilidade de em Portugal (Portalegre) se produzir a primeira aeronave ligeira (ATL-100) para 19 passageiros e que envolve um investimento na ordem dos 140 milhões de euros e a criação de 1200 novos empregos. Tenhamos esperança.