Ana Marinho Soares
A distância social é segurança, é a forma cívica de mostrarmos sem ser por palavras “eu preocupo-me contigo”, mas quando extremamente exagerada pode fazer sentido só no reino da solidão.
São já alguns os discursos de lamúria de idosos que se repetem no meio das consultas. Dizem-me que não vêem os filhos e/ou os netos desde o início da pandemia. Em todos os casos referem ser o receio do contágio que está na origem do afastamento. “Vamos falando às vezes ao telefone”…, “ainda morro antes disto tudo acabar sem os voltar a ver”… despedia-se uma senhora chorosa fechando a porta do gabinete.
São histórias que partilharam comigo, dentro da “salgalhada” que é esta História Pandémica, mas são a vida, são o dia a dia, são o sofrimento de pessoas idosas.
Não existe uma verdade absoluta, mas a verdade de cada um e a realidade familiar em que se enquadra, interpretada como amor ou como abandono.
É difícil perceber o ponto que separa os gestos de cuidados efetivos, da obsessão do cuidado extremo. Pode depois ser muito ténue a margem entre esta obsessão do distanciamento como cuidado ou como um abandono justificado.
Já houve idosos que me disseram sentir muito a falta de um abraço.
Os idosos precisam que os protejamos da COVID 19, mas também precisam do afecto das famílias. Havendo vontade, responsabilidade e amor será possível, salvo raras excepções, combinar ambas. Pode haver uma visita à janela mas ao vivo e a cores, pode haver um abraço de 4 segundos com uma máscara FFP3 e restante equipamento de protecção dos pés à cabeça, depois de um banho em desinfectante se preferirem! Agora, por favor, que não seja a obsessão do humanismo que, ironicamente, nos torne desumanos.