Maria João Covas
Quem me lê deve achar que começo a ser monótona, mas a verdade é que o facto de escrever estas crónicas permite-se entender que começo a ter um padrão nas minhas leituras: autores portugueses que não conhecia e estou a gostar muito de descobrir.
Num momento como o que estamos a atravessar todos tentamos consumir o que é português. Todos tentamos voltar a valorizar o que é nosso, desde os produtos, até ao comércio local. Porque não fazer o mesmo na literatura? Porque não consumir os nossos? Mas, e sendo o mais honesta possível, este padrão é inconsciente. Hoje não sei sobre o que vou escrever no próximo mês, nem sei bem o que irei ler. Daí a inconsciência. Mas que o padrão existe, existe.
E neste mês, nesta época de confinamento, trata-se de uma mulher, uma enfermeira (o meu obrigada por isso), casada e mãe. Uma mãe que escreve sobre esse mesmo tema: filhos e mães. “Tudo pela minha mãe” de Celina Lopes é um hino às mães e, simultaneamente, um cântico às nossas penas, temores e medos.
Pedro, o narrador do livro, um rapaz de oito anos, salta pela janela do quarto e vai caminhando até à cidade. Pelo caminho encontra lugares, uns mais conhecidos do que outros; pessoas, umas mais importantes que outras, mas todos esses elementos acabam por criar uma narrativa que vai dando consistência e amparo ao jovem angustiado. Pedro tem de, tal como todos nós, apreender a viver com os seus medos, as suas angústias, os seus fantasmas, as suas perdas.
Depois volta, pelo mesmo caminho, pelas mesmas pessoas, pelos mesmos lugares ou talvez não. Quando se volta os lugares transformaram-se, o passar do tempo fez com que nos tornássemos outros. Quando se volta nem nós, nem os outros somos os mesmos. O caminho torna-nos diferentes, faz-nos mudar, torna-nos… melhores? Piores? Não sei, mas os mesmos não somos. Pedro fica mais consciente, de si, das suas emoções, dos seus deveres, das suas vontades. E, simultaneamente, percebe o valor que os que o rodeiam têm na sua vida e na sua formação enquanto pessoa.
Mas será que Pedro é uma voz estranha, ou será que é a nossa voz? Os seus medos, as suas angústias, os seus terrores e as suas percas serão assim tão diferentes das nossas? Das minha não foram. Eu revi-me no Pedro e nas suas interrogações.
Revi-me naquela mãe que sofre por si, mas que principalmente sofre pelos seus, pelos que tem de abandonar e deixar ir.
“Um dia não vou chorar. Hoje não é o dia.” diz Celina pela voz de Pedro. Um dia vou deixar de ter medo. Hoje não é o dia dirão todas as mulheres que passam pela situação retratada no livro.
Um livro que me deixou sem respiração, sem justificação para não revisitar os meus demónios e os meus medos. Mas que me fez ter fé, ter esperança que mesmo na adversidade renascemos, redescobrimo-nos.
Afinal o caminho faz-se caminhando. E, na vida, não podemos parar.