Ivo Gama
É possível uma pessoa necessitar de “injeções nos olhos” para tratamento de doenças oculares? Sim, é possível, dependendo da patologia e da situação clínica da mesma.
Uma das modalidades terapêuticas em Oftalmologia constitui a administração de injeções intravítreas, ou seja, injeções de medicamentos / substâncias farmacológicas próprias para serem introduzidas na “gelatina” que existe no interior do globo ocular. São usadas para tratar várias doenças em Oftalmologia como: 1) retinopatias vasculares que causam proliferação de vasos anómalos na retina (neovascularização), sendo a mais comum a retinopatia diabética proliferativa; 2) edema macular (“inchaço” ou “líquido” na parte central da retina, a mácula) de diversas causas, como retinopatia diabética, oclusões (ou “tromboses”) vasculares da retina, entre outras (inflamatórias, etc); 3) líquido intra-retiniano ou sub-retiniano ou neovascularização macular secundária a várias doenças, sendo a mais comum a degenerescência macular de tipo neovascular (exsudativo), mas existem outras causas.
Existe, atualmente, uma diversidade de medicamentos ou fármacos que podem ser administrados desta forma e pertencem a distintas categorias farmacológicas. Têm como objetivo inibir o crescimento e/ou favorecer a regressão de novos vasos anómalos (prejudiciais) na retina e/ou diminuir a acumulação de líquido na retina.
O procedimento é simples, rápido e seguro e geralmente bem tolerado pelo paciente. Antes do procedimento, o doente necessita de assinar o consentimento informado, se já não tinha feito isso previamente na consulta, no momento em que o tratamento foi proposto. É realizada uma medição dos sinais vitais e da glicemia dos pacientes pela equipa de enfermagem. Como existe um risco extremamente pequeno (mas real) de infeção intraocular grave (denominada de endoftalmite, potencialmente causadora de cegueira irreversível), o procedimento tem de ser realizado em condições de assepsia, como qualquer outra cirurgia oftalmológica. Por isso, o procedimento é encarado como um procedimento cirúrgico e é realizado no bloco operatório ou numa sala com condições equiparadas a uma sala de bloco operatório, com condições de fluxo laminar, ou ligeiramente pressurizada e sistemas de filtragem do ar, para evitar a contaminação do material utilizado na injeção.
A anestesia é realizada com gotas (anestesia tópica), ficando o paciente acordado durante o procedimento cirúrgico. A anestesia tira a sensação de dor, mas não tira a sensação de toque. Imediatamente antes de administrar a injeção intravítrea, o médico Oftalmologista realiza a desinfeção das pálpebras e da superfície ocular externa, procedimento fundamental como medida de prevenção da endoftalmite. São colocados campos operatórios, uma espécie de “panos esterilizados” que servem para isolar a área ocular e palpebral desinfetadas das restantes áreas da face (não desinfetadas). É colocado, no olho, um aparelho especializado, que permite manter as pálpebras afastadas durante o procedimento. A injeção demora alguns segundos e, no final, realiza-se um reforço da desinfeção da superfície ocular externa.
Os doentes são submetidos a uma fase inicial (fase de dose de carga) de tratamento com várias injeções mensais (que varia entre 3 e 6 injeções, tendo em conta a patologia em questão e a decisão do médico), havendo depois uma fase posterior do tratamento, que varia de acordo com a patologia, com a evolução da mesma e com a resposta ao tratamento, fatores que são avaliados pelo médico, de forma a decidir o plano de tratamento posterior com múltiplas injeções intravítreas.
Após a injeção intravítrea, é comum o aparecimento de uma mancha vermelha na região esbranquiçada do globo ocular (hemorragia subconjuntival), que, apesar de causar preocupação em muitos doentes, não passa de uma situação totalmente inofensiva e que irá desaparecer espontaneamente após algumas semanas, sem afetar em nada a visão. É comum nos primeiros dias após a injeção, haver uma maior sensibilidade à luz e sensação de corpo estranho ou de “areias” nos olhos, assim como picadas oculares, e que desaparecem geralmente após 2-3 dias, e devem-se, geralmente, a uma maior irritação da superfície ocular externa, causada pela desinfeção da mesma durante o procedimento cirúrgico, que é uma situação frequente e inofensiva. Para aliviar estes sintomas, os doentes podem usar óculos de sol, evitar exposição à luz excessiva e podem usar um colírio de lágrima artificial para lubrificação ocular. Podem também aparecer umas “manchas” pretas ou “moscas volantes” no campo visual, que se devem a pequenas bolhinhas de ar, que são inofensivas e que irão desaparecer ao fim de alguns dias. Também é normal o olho ficar um pouco vermelho nas primeiras 48h após o procedimento. No entanto, se após alguns dias, o doente notar uma diminuição franca e súbita de visão (ou mesmo perda total de visão), um olho extremamente vermelho e doloroso, situação esta que é rara, mas que pode acontecer, o mesmo deverá recorrer ao Serviço de Urgência do Hospital mais próximo, para avaliação por um médico Oftalmologista.