Tatiana A. Santos
O Rasputin de Putin
Alexandr Dugin é um filósofo russo, nascido em 1962 e um dos autores e comentadores políticos mais conhecidos da Rússia pós-soviética. Desde 2001 que lidera o Movimento Internacional Eurásico. A filosofia, inspirada pela nova direita europeia, tem pano para mangas, mas o conselheiro de Vladimir Putin não é uma personagem muito conhecida fora da Rússia. Por isso é importante explicar ao Mundo, quem é o cérebro que faz dançar a marioneta. Na base das inspirações filosóficas de Dugin estão nomes como o belga René Guénon e o italiano Julius Évola… para quem não sabe, falamos dos pais do neofascismo cultural místico durante a segunda metade do século XX. Dugin iniciou a sua carreira política como militante anti-comunista durante os anos finais do regime soviético. Quando o regime caiu, passou a trabalhar na Duma (Câmara dos Deputados Russa), como assessor do seu presidente Gennadiy Seleznyov – estávamos nós no final da década de 90. Não levou muito tempo até conseguir o destaque que ambicionava ao actuar nos bastidores do teatro político e cedo, tornou-se o braço ideológico de Vladimir Putin. O seu discurso sempre encontrou eco na extrema-direita europeia, influenciando este pensamento em alguns países.
Dugin é o mentor do euro-asianismo ou da neo-Eurasia. Mas que raio quer dizer este palavrão? Perguntam. Dugin defende a expansão da Rússia aos antigos territórios da URSS de forma a conseguir ganhar a guerra cultural com o Ocidente. Há uns dias, publicava na sua página de Facebook que a Rússia seria a nova Roma e que o Ocidente seria a prostituta da Babilónia. Todo o seu pensamento é um misto de filosofia política com Bíblia e textos apocalípticos. “Roma somos nós. Nós somos Roma”, rematava, cheio de soberba imperialista e prepotência, instigando o Kremlin – mais especificamente Vladimir Putin – a não desistir da conquista de um novo continente que possa mostrar o poder face ao Ocidente, ao mesmo tempo que coloca Moscovo no centro do poder mundial.
O Rasputin de Putin acabou por se tornar um nome de referência no ultra-nacionalismo da Rússia, ao ressuscitar esta ideia da neo-Eurásia em que se precisa aumentar território para ganhar a guerra cultural com o Ocidente e ser o contraponto do atlantismo. Por isso, tem invocado cada vez mais ideias conservadoras, ortodoxas e antidemocráticas, semelhantes às do filósofo monárquico Ivan Ilyin, ou do nacionalista populista Lev Gumilyov (1912-1992). Putin está rodeado por Personas anti-democráticas e, em muitos casos, anti-semitas, que são bem apoiadas pela extrema-direita mundial. Ao rejeitar a noção ocidental de democracia, acaba por traçar um perfil humano muito diferente para seu povo: “Para nós, russos, a humanidade equivale a pertencer ao todo. Para nós, o ser humano não é um indivíduo”, referiu Dugin numa entrevista a um canal de televisão Canadiano. Acabou assim por se tornar famoso pela sua “quarta teoria política” e é com base nela que assessoria Vladimir Putin. Dugin defende que a democracia liberal – que considerada a “primeira teoria” – não passaria de uma ferramenta de domínio norte americano. Para enfrentar este poder, a Rússia teria de juntar a segunda e terceira teorias, ou seja, socialismo e fascismo num novo modelo de fascismo adequado ao nosso século. Na sua opinião, o Ocidente representa morte, suicídio e degeneração. A tal “Prostituta da Babilónia” a que Dugin se refere tantas vezes nas redes sociais (sim, eu sigo-o para poder saber o que diz. Acreditem que não tenho particular solidariedade com a causa).
Centrando-nos agora no conflito existente entre a Rússia e a Ucrânia (ou seja, na invasão injustificada por parte da Rússia), o que sabemos sobre o papel do filósofo Alexandr Dugin? Sabemos que, na plataforma online VK, Dugin descreveu a guerra à Ucrânia como uma condição necessária e imprescindível para o renascimento do Império Russo. Em julho de 2014, numa entrevista dada à BBC, Dugin defendeu e assumiu ter sido um dos ideólogos responsáveis pela anexação russa da Crimeia, até então pertencente à Ucrânia. A ideia surgiu-lhe em 2008 quando a Rússia invadiu a Geórgia. O expansionismo é a única ferramenta que Dugin defende como eficaz para a manutenção do poder de Vladimir Putin. Chegou mesmo a usar sondagens como validação desta ideia. Antes da invasão da Crimeia, a popularidade interna de Putin rondava os 60%. Após a invasão, subiu para 86%. O Rasputin de Putin atribui essa subida ao fortalecimento do patriotismo russo.
No dia em que Donald Trump ganhou as eleições, Dugin comentou que o momento se tratava de algo “incrivelmente bonito” e “um dos melhores momentos” da sua vida, chegando a afirmar que considerava “Trump como o Putin americano”. O que Dugin não sabe ou talvez se esqueça, é que não se pode querer ser Roma enquanto se rotula o Oeste de Babilónia. Babilónia foi a designação dada precisamente ao Império Romano após a segunda destruição de Jerusalém. Por isso, Sr. Dugin, se quer que a sua Rússia seja Roma, não se esqueça de que a grande prostituta da Babilónia mora na vossa casa.