Regina Sardoeira
Tudo o que vemos esconde outra coisa, e nós queremos sempre ver o que está escondido pelo que vemos.” René Magritte
Pesquisadora do sentido da existência, ou filósofa da existência (se a palavra filósofa não doer aos ouvidos perros amordaçados ao senso comum) encontrei-o na busca da felicidade, como todos, embora não essa felicidade rasteira, feita de gestos e prazeres quotidianos em tudo similares aos dos animais ou aos dos bárbaros.
Pensei-me, um dia, como ser de excepção e urdi a crença de que, algures, ainda não descobertos, viveriam os meus pares, aqueles que se alcandorariam até às estrelas metafóricas do sublime e lá me encontrariam para celebrarmos juntos a festa!
Bem sei que tenho um ou muitos irmãos nesta busca, um ou muitos solitários perseguidores de outros solitários perdidos nas esferas do ser.
Nietzsche foi um deles.
Solitário a contragosto, solitário por necessidade intrínseca de uma excepcionalidade que nada tem a ver com orgulho, uma excepcionalidade constitucional feita de células nervosas propensas ao delírio da perfeição… e ele, de tanto procurar e de tanto afugentar de tanto escolher e de tanto acabar perdendo viu-se ensimesmado, dolorido, entregue à inconsciência de uma loucura física, corolário da outra, aquela que ressuma como água gelada de cada um dos seus textos inflamados.
Sentido?
A existência?
Pares das alturas?
Amigos tecidos no mais profundo?
Deverei esperá-los?
Devererei querê-los?
Desde Nietzsche, até aos dias de hoje, o mundo amesquinhou-se e ele bem o disse nos clarões da sua lucidez.
Visionário de outros mundos, ele soube que o génio seria pisado quotidianamente pela horda dos filisteus, esses que produzem “grandes” obras e que são honrados pelas moscas da praça pública.
Dar, eis o que o solitário deseja, dar de si aos outros, esses que passam por ele em embarcações idênticas e que, quantas vezes, mudam de rumo ou se escondem, crentes de que lhes queremos roubar a substância ou a vida! E contudo apenas queremos receber de volta daqueles a quem damos, dando-nos, o sinal de que a entrega foi feita e recebida no momento oportuno!
(A exposição UTOPIAS, presente na Doçaria Mário, seria um excelente pretexto para um encontro de “pares” à volta de uma mesa: porque aqueles quadros são muito mais que “peças para venda”!)