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Cidadania e Sociedade

ANA RITA VIVE NUM QUARTO A MAIS DE 300 KM DE CASA PARA PODER SER PROFESSORA

Foi neste domingo, 10 de setembro, que a Agência Lusa deu a conhecer a história da professora Ana Rita:

Já é avó, mas vê-se obrigada a viver longe da família para poder trabalhar. Vive num quarto alugado na Amadora, a 300 quilómetros de casa, porque não tem dinheiro para outra opção. Há outros professores a abandonar a carreira. “O tempo passa e eu ponho-me a olhar para trás e a questionar: Quando é que isto vai acabar?”

António Cotrim/Lusa

O recomeço das aulas significa para muitos professores afastarem-se das famílias e viverem em condições precárias. É o caso de Ana Rita Pinto. Aos 50 anos, já é avó, mas vive sozinha e longe da família num quarto alugado na Buraca, na Amadora.

Ana Rita Pinto é professora do 1.º ciclo e no ano passado entrou finalmente para os quadros. Aos 49 anos ficou na escola Alice Vieira, no bairro da Buraca, a 300 quilómetros de casa.

Natural de Viseu, tentou dar aulas na região, perto da família, mas as dívidas aumentavam de dia para dia. “Num ano tive um horário de sete horas por semana e, no seguinte, um horário de cinco horas, sendo que recebia menos de cinco euros à hora”, recordou, contando que tentou arranjar trabalhos em part-time mas, no final do mês, levava para casa cerca de 300 euros.

A solução foi aceitar uma vaga onde mais faltam professores: nas escolas do sul do país. Ana Rita já tinha estado sete anos na zona de Lisboa e um ano em Portimão, sempre em quartos arrendados.

“Costumo dizer que há estudantes da faculdade que estão melhores do que eu. Acho que já merecia, eu e muitos outros, um bocadinho mais de respeito”, lamentou a docente, sublinhando que teve de deixar o filho com os avós em Viseu para poder continuar a dar aulas.

Ainda tentou, sem sucesso, levar o filho: “Disse-lhe para vir, mesmo tendo de ficar num quarto improvisado, mas não quis, já estava a ficar crescido”, recordou a mãe, que vive agora com o peso de ter visto o filho abandonar os estudos antes do tempo.

“QUANDO É QUE ISTO VAI ACABAR?”

Professora do 1º ciclo da Escola Alice Vieira, na Buraca, Amadora, Ana Rita Pinto vive num quarto porque não tem dinheiro para viver numa casa. António Cotrim/Lusa

Ana vive num quarto no bairro da Buraca, na Amadora, e prepara as aulas na cozinha ou no quarto, porque “a casa não tem sala”. “Sujeitei-me a muita coisa porque sempre acreditei que um dia teria alguma compensação, mas o tempo passa e eu ponho-me a olhar para trás e a questionar: Quando é que isto vai acabar?”, desabafou.

Para trás ficaram 18 escolas de norte a sul do país e “14 quartos aqui e ali”. “Já cheguei a acordar em quartos e perguntar-me: ‘Onde é que eu estou?! Alto, lembras-te que alugaste um quarto ontem’. É um desgaste enorme”, contou.

Além da falta de condições, Ana Rita sente-se muitas vezes sozinha: “Às vezes, é chegar a casa, ao quarto e estamos ali na nossa solidão. Ao telefone, vamos acompanhando a nossa família e depois é a correria de fim-de-semana”.

Aos elevados preços dos quartos, somam-se as contas do gás, água, eletricidade, conta de supermercado e despesas inesperadas, como uma avaria do carro. A professora Ana Rita recorda o dia em que teve de levar à oficina o seu “carro velhinho, que usava para dar aulas em várias escolas”.

“Eu ganhava muito mal e quando o mecânico me apresentou a fatura, que era praticamente o meu ordenado, até lágrimas me caíram”, recordou a professora do 1.º ciclo, que ficou sem dinheiro para pagar os 400 euros do quarto alugado no bairro de Benfica.

Todas as semanas faz, religiosamente, 300 quilómetros para estar com os pais, o filho e os netos. Nessas viagens, quase sempre de transportes públicos ou em boleias partilhadas, conhece histórias “ainda piores”.

“Tenho colegas com crianças pequenas que choram e têm pesadelos, porque a mãe vai embora e elas ficam com o pai ou com os avós. Quantos anos é que as pessoas vão andar nisto?”, questionou.

DR: LUSA/ EXPRESSO

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